domingo, 21 de abril de 2024

Nem Búzios, nem Cabo Frio: outra cidade do Rio desbanca as preferidas.


Toda a atenção agora se volta para Rio das Ostras, na Costa Azul. Gastronomia 
requintada atrai turistas amantes da boa mesa à capital fluminense do jazz e blues.

Rio das Ostras (RJ) - O renomado chef José Hugo Celidônio (1932-2018) era um frequentador assíduo de Rio das Ostras, tanto que deixou um discípulo por ali: o engenheiro Pedro Rodrigues, hoje proprietário e chef do restaurante Bartrô, onde aplica as lições tomadas com o mestre, sobretudo a arte de receber bem. De uns tempos para cá, a gastronomia tomou conta da localidade conhecida como a capital do jazz e do blues por onde passou Charles Darwin, com uma boa leva de bares e restaurantes chegando para ficar. Inclusive uma adega/bistrô onde foram lançados dois espumantes especialmente para o aniversário da cidade. Rio das Ostras completa 32 anos este mês, esbanjando frescor de um balneário pronto para ser um polo gastronômico da dourada Região dos Lagos.

Boa música.
Rio das Ostras é azul. É também a capital fluminense do jazz e do blues, segundo decreto de uma lei estadual. Anualmente, tem festival do gênero em cinco palcos pela cidade, no feriado de Corpus Christi. Mais de cem horas de música, 300 artistas, incluindo atrações internacionais. O curso de produção cultural da UFF existe em razão do jazz. Um ponto de encontro para ouvir jazz e blues fora do festival é o Hotel Atlântico, que está fazendo 40 anos. De frente para o mar da linda Costa Azul, são 36 suítes (diárias a partir de R$ 240), piscina, sauna e um salão com centenas de fotos de relíquias da música mundial (Bob Dylan, Paul Mccartney, Madonna…) transformado no Galleria Gastrobar, porta de entrada do Atlântico, tocado com maestria pela chef capixaba Penhamara Araújo, com ajuda da sócia e chef Silvia Stanzani. Penhamara é sobrinha da sócia do Atlântico, Penha Araújo, que trouxe do exterior as imagens que estampam as paredes.

A tia cinéfila ia para os EUA todo ano e voltava com pôsteres dos artistas de Hollywood, que a sobrinha reuniu numa galeria de fotos e partir dali um gastrobar, com jazz/blues tocando o ano inteiro, tanto ao vivo quanto na caixa de som. Para sair cantarolando lararara pela rua… A moqueca capixaba (sem dendê, nem leite de coco, nem coentro) faz sucesso por ali, mas não tanto como a torta capixaba, com mariscos na massa. “Importei um pouco da culinária e cultura capixaba para cá, inclusive no preparo dos pratos, em panelas de barro, um patrimônio imaterial no Espírito Santo, fabricadas por mulheres paneleiras organizadas em cooperativas”, comenta Penharama. “Trabalhamos também com as desfiadeiras de siri.”

Circuito de sabores.
E por conta do circuito turístico de música, a gastronomia está bombando em Rio das Ostras. Nos anos 2000, o então engenheiro Pedro Rodrigues pediu demissão do cargo que ocupava numa empresa de insumos medicinais e percorreu o Caminho de Santiago de Compostela. Logo em seguida, começou a frequentar Rio das Ostras, vendo aflorar ali uma cultura gastronômica. Das edições do Festival de Frutos do Mar com José Hugo Celidonio e outros chefes de prestígio, como claude Troisgros, até a lugar de prestígio que seu Bartrô ocupa no balneário, em 20 anos sevindo produtos frescos e insumos daquele mar: congro negro, “caviar” de tomate-seco e molho de tamarindo. Atenção redobrada para o steak au poivre (coberto com grãos de pimenta grosseiramente quebrados), dos tempos áureos de Zé Hugo em seu Club Gourmet, irrepreensível no ponto da carne e no sabor do molho. Vem dali o prato dos 20 anos do Festival da Boa Lembrança, que traz uma mandala, a marca do Bartrô. O primeiro prato da Boa Lembrança surgiu junto com a casa, em 2001, e de lá para cá virou um cliente frequente. “Funciona como uma espécie de clube para os chefs se encontrarem e conversarem”, diz Pedro, que mantém os três filhos trabalhando no salão, que na verdade é o quintal de sua casa.

Espumante exclusivo.
E na carona, a enogastronomia também. Dois espumantes foram lançados para celebrar os 32 anos de Rio das Ostras. A iniciativa foi da Madame Merlot - personagem por trás da sommelier capixaba Geni Machado, proprietária da adega que vem colocando vinho bom na taça dos moradores e turistas. “Fui criada em Rio das Ostras, que a partir de agora vai voltar a ter ostras (risos)”, brinca, sobre as ostras que chegam de SC diretamente para seu restaurante, no interior da adega. Os espumantes comemorativos vêm da Serra Gaúcha, feitos na Lidio Carraro, vinícola boutique no Vale dos Vinhedos que assinou os vinhos da Olimpíada no Brasil. Serão mil garrafas de cada, um será o Pérola Brut (chardonnay e pinot noir) e o outro, Pérola Moscatel. O chef Maurimar assina o menu que tem início com arancini de cordeiro e passam por cogumelos Paris com creme de gorgonzola, fettuccine com cavaquinha (local) até chegar num prime rib duroc (corte feito na transversal incluindo o lombo e a costela) com purê de feijão branco e repolho; além de pescados daquela costa (camarão e dourado). O menu executivo sai por R$ 89,00.

A harmonização fica sempre a cargo da Madame, que dá o start com espumante Garbo (enologia criativa) e segue com Laroche Chablis premier cru safra 2020, Garzon tannat single vineyard safra 2020 e Domaine Seguinot bordet petit Chablis. A gigante Garzon vai servir os vinhos do jantar harmonizado (R$ 269,00) agendado para este sábado (13/04), no qual o stinco de cordeiro braseado lentamente com legumes e vinho tinto virá na companhia do petit verdot single vineyard.

Recanto de Darwin
A cidade da Costa Azul surgiu de uma vila de pescadores. O Rio das Ostras, que dá nome ao município, existe como rio desembocando na Boca da Barra, no mar, onde se avista o mais lindo point para o pôr do Sol. Fica ali o Quiosque da Tia Daci, que serve o inigualável kibe de peixe com camarão (R$ 10,00). Próximo, a festa da fauna riostrense formada por tartarugas, baleias e guaiamuns (o caranguejo azul). Ao visitar o destino, faça passeios de barco para praias mais distantes, visite o Museu Sítio Arqueológico Sambaqui Tarioba. Charles Darwin passou por ali (o naturalista inglês, autor da teoria da evolução das espécies, passou pelo Rio de Janeiro em 1832 quando esteve no Brasil. Para guardar esse interessante momento da história, foram criados os Caminhos de Darwin, com 2,2 quilômetros). Slow Food no meio do mato e de frente para o mar (Praia Virgem). Cozinha simples e confortável: Casa do Mar, onde se degusta camarão empanado ou flambado no conhaque no abacaxi (R$ 69,90) com catupiry e queijo canastra, muito bem acompanhando de um gim tônica de limão siciliano (R$ 38,00). A saideira? No Pátio Costazul, onde tem o craque Guto Chamarelli, proprietário da World Drinks, fazendo estripolias com as mãos em criações autorais.

Bate-volta a Casimiro de Abreu.
Rio das Ostras sempre foi, mas antes de se emancipar fazia parte do município Casimiro de Abreu, onde tem a casa em que o poeta nasceu (ele escreveu apenas um livro na vida, “A casa de primavera”). O túmulo dele fica atrás da igreja, e as pessoas o visitam. Um poeta sonhador exilado em Portugal escreveu sobre seu país e um grito de saudade das terras onde passou a infância e adolescência. De volta ao Brasil, colaborou para jornais, entrou para a Academia Brasileira de Letras e passou os últimos dias de vida na casa onde viveu a infância, hoje um museu na pequena cidade que leva seu nome: Casimiro de Abreu, a 30 minutos de Rio das Ostras. Basta um dia para percorrer a beira do Rio São João e ir parando nas construções coloniais à procura de traços da história e boa gastronomia. São ao menos seis bons restaurantes na via. O Simpatia é um dos mais antigos e o fio condutor desta renovação culinária local. É possível desfrutar de um almoço bucólico à beira do Rio, como serviço da casa que inclui cerveja gelada e um leque de opções de frutos do mar (mariscos, polvo e lula), além de pescados como pitangola, dourado e robalo.“Existe um interesse muito grande em oferecer uma gastronomia com segurança e feita com insumos locais”, garante o proprietário, Osmar Soares. Ele mesmo prepara a comida, no caso deste jornalista que vos fala, pescada grelhada ao belle menuère (molho a base de vinho branco) servida com risoto de siciliano e batatas rústicas (R$ 176,00 para três pessoas).“Simpatia é quase amor”, para quem não sabe, é o nome de um poema famoso de Casimiro.

Mais adiante, no Capri, o chef Paulo Fernandes trabalha com ostras e vieiras frescas, mexilhões de Búzios, polvo e lagosta. “O imóvel era uma casa abandonada”, conta ele. Ali também é oferecido day use (R$ 30,00) para usar a piscina, além de servir de galeria de arte com exposições temporárias e obras à venda. O artista da vez é Robson Fasolin. Cultura, arte, história e gastronomia. Uma viagem que vale um poema.

*O jornalista viajou a convite do Hotel Atlântico e do Galleria Gastrobar.
https://www.em.com.br

Nenhum comentário:

Postar um comentário