Cigarro: ‘Me livrei do vício que me aprisionava’


Comecei a fumar aos 17 anos, na faculdade, porque queria parecer mais velha – era a caçula da turma. Na época, fim dos anos 80, fumar era sinônimo de liberdade e independência para as mulheres. Eu fumava escondido da minha família, em sinal de respeito aos meus pais – como se não percebessem o cheiro de cinzeiro ambulante. Mas na faculdade longe de casa, era um maço por dia. Ou dois, quando tinha festinha de república, shows, festivais de poesia, barzinhos…, e tantas outras atividades da movimentada agenda de uma jovem universitária. Foram longos anos vivendo feito chaminé ambulante – e logo eu que nunca gostei do cheiro da fumaça e nem sabia tragar direito. Naquela época, não tinha repressão. Eram outros tempos, sem a patrulha que hoje persegue os fumantes. Vivíamos novos tempos da abertura política, do começo de uma nova era pós-ditadura militar. Fumar não era feio. Ao contrário, dava um certo charme, um glamour que não tinha nada de inocente. Imagina para a menina do interior que queria se autoafirmar? A propaganda também era liberada. Tinha até cigarro de chocolate com imagem de criança fumando. E podia-se fumar em ônibus, no restaurante, no cinema (tinha até cinzeiro nas salas de projeção)… Já jornalista formada, fumava até na cara do entrevistado. E quantas vezes parava o carro da reportagem para…, (pausa) cuspir. Isso mesmo, cuspir. Era nojento aquele pigarro horroroso.


Propaganda de cigarro estimulava o consumo, principalmente entre as mulheres

E lá se vão quase 20 anos desde que eu parei de fumar. Para parar, não foi fácil, mas era preciso uma decisão. Ou o cigarro, ou minha vida. Além do pigarro, que me obrigava a cuspir em ocasiões e locais mais impróprios, o vício era um risco à minha segurança. Acordava no meio da madrugada, acendia um cigarro e adormecia novamente. Foram vários edredons e lençóis queimados, por sorte, sem nenhum outro transtorno maior. Mas aquele cheiro impregnado em mim incomodava. A necessidade de me impor sobre um vício que me dominava era um desafio.

Parei de fumar de uma hora para outra. Joguei fora o maço de cigarro. Era o último. Foi choque mesmo. Não dava para ir parando aos pouquinhos. A sensação era de que queria “comer as paredes”, de tanto nervoso. Eu sofri. Mas consegui me livrar do vício, um ano depois da promessa feita ao meu pai em seu leito de morte (ex-fumante, ele me pediu que parasse ao sentir o cheiro forte em mim após fumar escondido no banheiro do hospital onde o acompanhava). Eu consegui. E se eu consegui, acredito que qualquer um pode parar, se assim desejar. É claro que ganhei qualidade de vida… e também peso. Passei a apreciar mais o sabor dos alimentos, tomei gosto pelos doces – coisa que acontece com boa parte dos ex-fumantes. E dali começava a batalha constante para manter o peso em equilíbrio. Mas, de longe, foi a decisão mais acertada da minha vida: me livrar daquele vício que me aprisionava. E ainda tinha a questão moral: o cigarro não podia ser maior do que eu.

No Dia Nacional de Combate ao Fumo (29 de agosto), senti vontade escrever esse depoimento aqui, para contar para vocês como eu venci o cigarro. E, se de alguma forma, isso contribuir para encorajar outras pessoas a, espontaneamente, também deixarem esse vício, posso ser uma pessoa muito mais feliz e realizada. Mas se você precisar de ajuda terapêutica ou de outras ferramentas para isso, não hesite. Busque o que for preciso. Antes que seja tarde demais.

* Rosayne Macedo é ex-fumante. Com orgulho.
http://blogs.odia.ig.com.br/

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