Cidadãos 'invisíveis' correm riscos em moradia precária no Centro do Rio

Cerca de 130 pessoas ocupam galpão com risco de queda a 500 metros da Prefeitura, sem ser notados.


O DIA

Rio - Por mais de dez anos, eles estiveram invisíveis ao poder público, mesmo situados a menos de 500 metros da sede da prefeitura, na Cidade Nova. Foi ‘necessário’ que um menino, morador do local, fosse flagrado num vídeo, descendo o Viaduto Paulo de Frontin em um velocípede, na última semana, para que os cerca de 130 moradores da comunidade ‘Invasão da Presidente Vargas’ ganhassem visibilidade e — finalmente — recebessem ações de segurança e cidadania. Na sexta-feira, pela primeira vez, os três andares construídos com restos de madeira dentro de um antigo galpão (com inúmeras rachaduras e infiltrações espalhadas pelas paredes de concreto) receberam vistoria da Defesa Civil.

Os agentes constataram risco iminente de queda e necessidade de demolição imediata do imóvel. A Defesa Civil já contatou as secretarias municipais de Habitação e Desenvolvimento Social, para que um plano de reassentamento das famílias seja posto em prática, de forma que os moradores não reocupem o local. Desde terça-feira, a Secretaria de Desenvolvimento Social realiza a inclusão dos moradores no Cadastro Social, para inclusão em programas de assistência. A Vara da Infância e da Juventude espera determinação do Conselho Tutelar para intervir junto às crianças que moram no local. O menino do velocípede, de 9 anos, já havia sido levado para um abrigo em Vila Isabel. Mas ele fugiu na quinta-feira.

Esperançosos com as iniciativas, moradores da comunidade já projetam o futuro. “Só estamos aqui por não termos opção. Mas, embora estejamos abrigados e tenhamos a privacidade que não teríamos nas ruas, vivemos com medo de uma tragédia, causada por uma queda”, desabafou a vendedora de doces,Verônica Oliveira, que está no quarto mês de gestação e sonha ser incluída no programa Minha Casa Minha Vida. “Minha filha merece crescer em condições dignas, diferentes dos lugares em que fui criada”, declarou emocionada.

CONDIÇÕES PRECÁRIAS DE HABITAÇÃO
Além dos problemas estruturais, o local só conta com um banheiro para atender a adultos e crianças. O forte calor no galpão (sem ventilação adequada) também é citado como um dos grandes problemas, ao lado das inundações causadas por chuvas e o alto número de ratos e lacraias que entram nas casas.


Apesar de ser formada por ex-moradores de rua (muitos deles com antecedentes criminais), a Invasão da Presidente Vargas tem espécie de ‘cartilha’ seguida por seus integrantes. O consumo de drogas e a prostituição são proibidos dentro do galpão, por conta do alto número de crianças que circulam por lá. Além disso, apenas convidados por moradores antigos podem ocupar possíveis barracos vagos.

Alta procura para morar lá
Apesar dos problemas de insalubridade e falta de estrutura do local, existe fila de interessados por vagas no galpão. “É o sonho de todo mendigo: estar em um local que ofereça teto, em pleno Centro da cidade, e que lhe permita o livre direito de ir e vir, o que não é encontrado nos abrigos públicos”, diz o morador de rua Alessandro Oliveira, que está instalado na casa de uma amiga por conta da gravidez da ‘esposa’, de apenas 13 anos. Apesar de não cobrar aluguel para que o amigo permaneça no local, a catadora de latas Suelen Souza confessa já ter ouvido relatos da prática por lá. “Embora seja proibido e ninguém assuma publicamente que faz, os valores cobrados para divisão dos cômodos variam entre R$ 100 e R$ 250 por mês”, revela.

Indício do despreparo do estado
Na visão de especialistas, a preferência de moradores de rua por locais de risco, em detrimento a abrigos públicos, é mais um indício da dificuldade do estado em equacionar o problema da habitação.

“Muitos abrigos apresentam fatores negativos, como furtos e brigas, e não há um regime de organização com regras próprias, como existem em uma comunidade”, opina o sociólogo da Uerj, Dário Silva, que credita ao fato do centro ter baixa concentração habitacional a ausência de denúncias sobre outras invasões da mesma natureza. Para a antropóloga Patrícia Birman, a localização também é atrativa. “Os trabalhadores urbanos têm facilidade para ir a outras regiões. A garantia de privacidade também é determinante”, garante.

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