'Temos que fazer uma verdadeira revolução', diz interventor sobre bondes

Rogério Onofre começou a trabalhar como interventor dos bondes nesta quarta-quarta | Foto: Alessandro Costa / Agência O Dia

O presidente do Detro salientou a dedicação dos profissionais como um aspecto positivo na visita que ele fez à garagem dos bondinhos

POR FRANCISCO EDSON ALVES

Rio - Após a vistoria na oficina de bondes no bairro de Santa Teresa na tarde desta quarta-feira, o interventor Rogério Onofre relatou que as condições do trabalho do local estão muito aquém do que seria necessário para a segurança mínima de profissionais e passageiros. Segundo Onofre, o aspecto do local é de abandono e é difícil estabelecer as prioridades diante de tantos problemas.

"Prefiro nem citar o que vi. Teremos que fazer uma verdadeira revolução, inclusive no trânsito de Santa Teresa. Não sei como não aconteceram outros acidentes desta magnitude. Pensei que fosse um desafio grande, mas não que fosse tão enorme assim", declarou o presidente do Departamento Estadual de Transportes Rodoviários (Detro).

Onofre acenou com a possibilidade da reativação e reestruturação do ramal e da estação de Silvestre, localidade de Santa Teresa, que seria integrada ao Corcovado. De acordo com ele, cerca de R$ 800 mil seriam suficientes para que a linha fosse reativada.

Uma das ideias do interventor é transformar a oficina em uma escola de formação de profissionais dos bondes e disse, em tom de brincadeira: "Bem que o Eike Batista podia adotar os bondes".

O presidente do Detro salientou a dedicação dos profissionais como um aspecto positivo na visita que ele fez à garagem dos bondes. "Eles são verdadeiros heróis com idade na faixa dos 45 anos. Eu encontrei profissionais humildes e dedicados que ganham menos de 1 salário mínimo. Um operador não chega a ganhar R$ 2 mil", analisou.

Mais cedo, Onofre afirmou que 15 servidores do Detro foram convocados para trabalhar em uma força-tarefa que vai atuar nos bondinhos. Em seu primeiro dia no cargo, ele explicou que será feito um raio-X da situação, incluindo uma análise das manutenções realizadas, dos processos judiciais e dos investimentos.

O interventor dos bondes não deu um prazo para a volta da circulação do transporte que se tornou um patrimônio cultural dos cariocas, mas afirmou esperar que seja o mais rápido possível. "Os bondes só voltarão a circular quando todo o esquema de segurança estiver garantido", garantiu.

Ele contou que vai se encontrar nos próximos dias com sindicatos e associações de moradores para tentar chegar a um acordo sobre o que precisa ser feito. "Os bondes não vão funcionar mais de qualquer maneira", disse, em tom de crítica à gestão anterior.

Cabral lamenta

Pela manhã, o governador Sérgio Cabral disse que os bondes são sucateados e sofrem com problema de gerência. "A verdade é que a frota dos bondinhos é sucateada, uns foram reformados e outros não. A verdade também é que não há controle de passageiros. O problema ali me parece de gerência desse tipo de controle", avaliou Cabral, que falou pela primeira vez sobre a tragédia.

O governador disse ainda que nomeou Onofre para o cargo de confiança para que ele dê um diagnóstico da situação. "Eu estou colocando o Rogério Onofre para me dar um diagnóstico verdadeiro, para relatar de fato quais são as condições", afirmou Cabral, que lamentou o ocorrido. "Nossa manifestação de consternação e solidariedade aos familiares e vítimas dessa situação. O estado se coloca à disposição e não vai fugir das duas responsabilidades".

Cabral afirmou também que vai aguardar o resultado das vistorias para se posicionar sobre as causas do acidente. "A perícia é muito importante. Não vou me precipitar sobre a questão da manutenção, pois já ouvi várias opiniões sobre isso".

O secretário estadual de Transportes Júlio Lopes reconheceu também nesta quarta que os bondinhos não receberam os investimentos adequados e corroborou as declarações dadas mais cedo pelo governador Sérgio Cabral. "De fato, tivemos muitas prioridades na secretaria e não se fez investimentos nos bondes como eram necessários. Apesar disso, foram investidos R$ 14 milhões, que é um valor bastante significativo".

Questionado se sucessivos consertos no bonde acidentado em um prazo de poucos dias não era uma prova de que ele estava sucateado e colocava em risco a vida da população, Lopes disse que a idade do bonde - 116 anos - exigia tantas intervenções mecânicas.

Sobre a intervenção do presidente do Detro, Rogério Onofre, o secretário disse que espera que Onofre dê sua contribuição, por sua energia e capacidade.

O político, contudo, não se manifestou sobre uma possível exoneração de Júlio Lopes do cargo de secretário estadual de Transportes. Júlio concedeu entrevista coletiva na tarde de segunda-feira e garantiu que não tem responsabilidade direta no acidente.

Bonde teve troca-troca de peças

Documento da Secretaria Estadual de Transportes mostra que o bonde número 10, que tombou em Santa Teresa no sábado matando 5 e ferindo 57, passou por 13 intervenções mecânicas em 22 dias, incluindo sucessivas trocas de sapatas do freio. A última intervenção ocorreu dois dias antes da tragédia. Os problemas chegaram a retirar o veículo de circulação três vezes no período.

Onofre não descarta privatizar os bondes de Santa Teresa. Para ele, a prioridade é a segurança: “Não temos tempo a perder, mas não posso definir prazo para que os bondes voltem a circular. Faremos inspeção completa da situação. As tragédias têm que servir de lição. Nossa preocupação será com a ordem e a segurança”.

Para especialistas, o registro de manutenções do bonde 10, ao qual O DIA teve acesso, é uma evidência da precariedade do veículo. De 3 a 25 de agosto, foram oito sapatas de freio trocadas, a intervalos de dois dias; troca do cabeçote do compressor (equipamento fundamental para o sistema de freio); seis regulagens realizadas no freio, superaquecimento do box, entre outros problemas. Dia 21 de agosto, o bonde apresentou falha nos freios e, dois dias antes do acidente, a oitava sapata foi substituída.

Para engenheiros, um veículo com esse histórico não poderia circular, principalmente em ladeiras, que exigem muito do freio. O vice-presidente do Crea, Luiz Antônio Cosenza, explicou que a sequência de manutenção corretiva mostra que o veículo estava com problemas. “Esse troca-troca de sapatas é estranho. É difícil que uma sapata nova apresente problemas. Elas duram de três a seis meses”, observou. Peritos do ICCE recolheram ontem peças de bondes parados na garagem para avaliar o desgaste. Laudo fica pronto em 30 dias.

odia.terra.com.br

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