segunda-feira, 12 de junho de 2017

Partidos trocam de nome para superar o desgaste generalizado da política.

Nova identidade na busca da confiança perdida.


DIRLEY FERNANDES

Rio - Ninguém duvida que o modelo de representação por partidos e lideranças que surgiu no Brasil com a redemocratização desceu ralo abaixo com a recente torrente de delações e com o fluxo de propinas por ela revelado. Partidos — de todas as colorações — são vistos, hoje, como forças tóxicas, capazes de contaminar qualquer iniciativa, sendo expulsos de grandes manifestações e vetados em pequenas reuniões. Poucos líderes escapam da vala comum das citações de seus antigos financiadores. Para fugir do barata-voa e tentar se conectar com o eleitor, os partidos tentam de tudo. A nova voga é mudar de nome, abandonando o costumeiro formato de siglas para adotar identidades com ares de modernidade, que passem uma ideia de que os tais partidos são, na verdade, movimentos. O PTdoB do combativo Silvio Costa se prepara para virar Avante; o PSL se metamorfoseou em Livres, e o PTN agora é o Podemos. As mudanças são explicadas de formas diversas, mas, além da fuga ao desgaste dos partidos, representam a esperança de repetir, no Brasil, o sucesso dos ‘partidos-movimentos’, que emergiram fora de estruturas políticas tradicionais e conseguiram rapidamente bom desempenho eleitoral — caso do francês ‘Em Marcha’, do italiano Cinco Estrelas e, claro, do espanhol Podemos.


'Os grandes partidos ainda têm vez, mas só se eles lançarem candidatos 
de perfil não tradicional', diz Antônio A. Queiroz, consultor.

“Não adianta mudar de nome se não mudarem os atores. O PFL passou a se chamar DEM, mas o partido manteve seus caciques e continuou do mesmo tamanho”, diz Antônio Augusto Queiroz, diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).

Os três partidos, no entanto, garantem que a alteração na identidade vai além do nome. “A mudança aconteceu de dentro para fora. Temos que estreitar os laços entre os cidadãos e as instituições políticas, e o PTdoB não representava mais nossos ideais”, diz o deputado federal Luis Tibé, do Avante. “O mundo mudou. Os partidos têm bandeiras estáticas. A sociedade se mobiliza hoje em torno de causas — fim do foro privilegiado, Fora Dilma, Fora Temer... — e nós vamos encampar essas causas”, diz a deputada federal Renata Abreu, do Podemos. “A questão importante para nós não é escapar da rejeição aos partidos, é construir uma alternativa com um recorte ideológico claro, do liberalismo”, garante Paulo Gontijo, do Livres.


Senador Romário aderiu ao Podemos; Luis Tibé preside o Avante.

Podemos: ex- PTN cresce de nome novo
Entre os três partidos renomeados, o Podemos está mais avançado em sua metamorfose. Em maio, a sigla PTN, sob a qual Jânio Quadros se elegeu presidente, foi aposentada. A proposta desideologizada do Podemos tem conquistado apoios importantes. O senador Álvaro Dias — eleito pelo PSDB e que estava no PV — já aderiu e é cotado para ser candidato a presidente pelo partido. A bancada pode chegar a 24 deputados — superando o PDT, por exemplo. O senador Romário sela sua filiação em 1º de julho. O segredo para o crescimento acelerado pode ser a flexibilidade ideológica. “Chega de direita ou esquerda. A ideologia não vai mudar um país. O Macron viu isso na França e disse: ‘Vamos em frente’”, diz a presidente da legenda, Renata Abreu (SP), que herdou do pai, José Maria, e do tio, Dorival, o PTN. A aposta nas ferramentas tecnológicas é parte da metamorfose. “As redes sociais, para nós, são canais de decisão. Com 20.000 apoios de uma proposta na nossa plataforma de participação, nos comprometemos a defender essa aposta no Congresso”.



Paulo Gontijo lidera o Livres no Rio.

A aposta na tecnologia também está no DNA do Livres. “Temos um aplicativo que torna transparente a participação de todo militante, o que evita favorecimentos”, diz Paulo Gontijo, presidente da legenda no Estado do Rio. “Isso é parte do nosso ideal de liberdade. Pelas redes sociais, queremos ouvir para depois tomar decisões”, garante o empresário do ramo de comunicação.

Um partido liberal a favor da descriminalização das drogas e as apostas em participação direta.
O Livres se difere do Podemos e do Avante em relação à clareza de seu recorte ideológico: é um partido fortemente ancorado no liberalismo (defesa da livre iniciativa, redução do tamanho do Estado, etc...). “Somos liberais em economia e também em comportamento”, diz Paulo Gontijo, presidente da legenda no Rio, citando como exemplo a defesa da descriminalização das drogas, bandeira mais comumente associada a partidos de esquerda. O Livres (que, oficialmente, ainda é PSL e ainda nem entrou com pedido de troca de nome no TSE) também aposta em lideranças e eleitores mais jovens — o que também o diferencia, já que cerca de 70% dos 10.700.000 de militantes partidários do país têm entre 35 e 59 anos. O partido não se alinha com o líder predileto de boa parte da direita brasileira. “Ainda não temos uma deliberação sobre candidaturas à presidência, mas, com certeza, Bolsonaro, não”, garante Gontijo.

Já o Avante não pode dizer que tem a mesma clareza ideológica do Livres. Mas a transformação do antigo PTdoB também passa pela proposta de criar espaço para a participação direta da população, anseio dos eleitores que se afirma diariamente pelas redes sociais. “Atendemos a esse chamado por mais espaços efetivos de participação política. Temos que estreitar os laços entre os cidadãos e as instituições políticas”, diz Luiz Tibé, presidente do partido. O Avante abriga quadros de extrato ideológico bem variado. O combativo Silvio Costa (PE) simboliza de alguma forma esse perfil: o deputado federal emergiu de partidos de direita para brilhar como defensor da ex-presidente Dilma e hoje diz querer “reinventar a esquerda”. Sobre o novo nome, definido em processo que vem desde o ano passado, com a ajuda de profissionais de comunicação, Tibé diz que “convida à ação, à mobilização e a união de um grupo na busca de soluções para o futuro”.

5 MINUTOS COM: ANTÔNIO AUGUSTO QUEIROZ.


Jornalista, analista político e diretor de documentação do Diap. (Fetramesp).


POLÍTICO TRADICIONAL SEM VEZ

O DIA: Os partidos que têm dominado a política brasileira por 30 anos estão quase todos enrolados em delações. Como vão reagir para tentar sobreviver?

Antônio Augusto Queiroz: Vão tentar lançar políticos ou pessoas de fora que fujam do perfil tradicional da ‘velha política’, mesmo que no fundo nem sejam tão diferentes assim. Por exemplo, o PSDB, muito provavelmente, será levado a lançar o João Doria (prefeito de São Paulo). Para a opinião pública, ele não foi eleito como político, mas como gestor, um empresário bem-sucedido.

Há quem acredite que PT, PMDB e PSDB perderão espaço.
Os grandes partidos ainda têm vez, mas só se eles lançarem candidatos de perfil não tradicional. Isso agora se intensificou, mas vem de antes. Dilma foi escolhida pelo PT justamente por seu perfil técnico e por não estar envolvida em denúncias.

Então, há espaço para um outsider (alguém de fora da política), inclusive na Presidência.
Se pessoas como Luciano Huck ou Joaquim Barbosa vierem por um grande partido, eles têm chances, sim, de se viabilizar. Nos pequenos, o tempo é curto para construir uma base sólida. A não ser que os grandes caiam no erro de lançar nomes tradicionais.

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