quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O Natal nada feliz de um Rio castigado pela crise


Crise levou embora nossa árvore de natal da Lagoa Rodrigo de Freitas.

Uma profunda crise, manifestada por uma recessão avassaladora, a corrupção galopante e salários atrasados, mais parece ser uma obra do personagem Grinch para roubar o Natal dos cariocas. As coisas estão tão difíceis no Rio, uma das mais festivas cidades brasileiras, que até a tradicional árvore da Lagoa foi cancelada e as sempre presentes luzes nas ruas são poucas. Nas lojas, vendedores vestidos de Papai Noel mais parecem resmungar do repetir, alegres, o costumeiro "Ho! Ho! Ho!""É realmente um Natal muito monótono. As pessoas não estão comemorando", observa Daniela Santiago, de 41 anos, enquanto procura presentes para crianças em uma loja que vende brinquedos baratos e decorações importados da China. "A maior parte dos meus amigos e parentes estão desanimados", desabafa.

Desempregada desde que perdeu o trabalho na área de Recursos Humanos, Daniela mora com a mãe, uma professora que desde setembro não recebe o salário integral. É difícil imaginar que poucos meses atrás o Rio de Janeiro sediava os Jogos Olímpicos. Hoje, na chamada Cidade Maravilhosa, os temas de bate-papo mais recorrentes são a criminalidade ou simplesmente "a crise""A crise" mais parece um diminutivo para a terrível recessão da economia brasileira, a situação quase falimentar do estado do Rio, a fuga dos investidores, os cerca de 12% de desempregados e um escândalo de corrupção que atinge toda a classe política, inclusive o presidente Michel Temer.

Os clientes de um salão em Copacabana "falam da crise todo o tempo", diz o barbeiro Jorge Almeida, de 41 anos. Ele conta que a sua cunhada, uma médica funcionária do estado, tampouco recebeu salário nos últimos dois meses. Calculando entre 20% e 30% a queda da clientela com relação às últimas semanas de 2015, Almeida diz que "os cortes de cabelo estão ficando em segundo lugar, depois do que é realmente necessário, como a comida".

A queima de fogos para saudar o ano novo, uma tradição que reúne até dois milhões de pessoas na praia de Copacabana, também sofrerá cortes. As autoridades anunciaram esta semana que os fogos de artifício, famosos em todo o mundo, serão reduzidos em 25%: a queima vai durar 12 minutos, ao invés dos habituais 16. E desta vez, não tem aquela faísca característica das vésperas do Ano Novo que se sente no ar, afirma Elaine Maria Silva, de 29 anos, que cuida de uma barraca de aluguel de cadeiras de praia. "Ainda não instalaram o palco. Normalmente, nesta época já estaria montado", exemplifica, sem deixar de tomar conta de seus clientes no trecho de areia mais popular do rio, lotado de banhistas até mesmo durante a semana. O corte mais visível deste Natal no Rio foi o cancelamento da árvore flutuante que há 20 anos era montada para as festas de fim de ano na Lagoa Rodrigo de Freitas, onde foram disputadas as provas de canoagem do Rio-2016.

O Bradesco, banco que financiava a árvore de 53 metros de altura e iluminação farta, anunciou abruptamente em novembro que não a patrocinaria. "Costumava ser um grande evento", afirma Fabio Ferreira de Souza, de 40 anos, que vende refrigerantes perto da Lagoa, um tradicional ponto turístico da cidade. "Sem a árvore, ninguém virá aqui", lamenta.

Os economistas preveem que o Brasil sairá lentamente da crise em 2017, mas poucos cariocas se sentem otimistas. Muito menos ao ver o agravamento da crise política em Brasília pelos escândalos de corrupção que sucedem uns aos outros. Jack de Haan, dono da joalheria Raul em Copacabana, lembra dos velhos - e bons - tempos do Brasil, há 30 anos, quando deixou a Holanda. Pouco a pouco, as coisas foram piorando para este comerciante de 63 anos. Para ele, esta temporada natalina foi "terrível""Na semana passada, não vendi nada. Cinco dias sem vender nada, com uma loja tão linda...", lamenta de Haan, com uma melancolia que não combina com a exuberância dos topázios, ágatas, ametistas e outras pedras semi-preciosas expostas em seu estabelecimento. "É uma pena... A política, a corrupção. Se não fosse por isso, o Brasil seria diferente", garante.

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