domingo, 5 de junho de 2016

Portadores de HIV enfrentam o fim do passe livre nos ônibus

Mudança na legislação municipal limitou o benefício aos 
doentes. Universitários reclamam que cartões foram cortados.


Cazu soube que não tinha mais as viagens ilimitadas 
quando entrou no ônibus e o cartão não funcionou.
GUSTAVO RIBEIRO

Rio - Os portadores do vírus HIV e estudantes universitários de baixa renda estão enfrentando uma via-crúcis para usufruir de um direito que lhes é garantido por lei: a gratuidade nos transportes públicos. Os soropositivos, que tinham viagens ilimitadas nos ônibus municipais do Rio, já que precisam de tratamento continuado, descobriram no recadastramento do RioCard Especial que as passagens foram reduzidas. Já o Passe Livre Universitário perdeu a validade antes do prazo de um ano. Quem não soube dos processos de atualização dos cadastros teve o benefício suspenso. Para os portadores de HIV, o motivo é que a prefeitura alterou, em abril, um artigo do Decreto 32.842, de 2010, que concedia direito ilimitado do RioCard Especial aos soropositivos com baixas condições financeiras. O novo texto prevê que essas pessoas “receberão o passe livre limitado ao número de viagens necessárias para o deslocamento às unidades de saúde para o tratamento de sua patologia”. Segundo o Rio Ônibus, associação que representa as empresas de transporte coletivo, o laudo emitido pelos médicos habilitados no sistema de saúde determina o número de viagens necessárias para os deslocamentos às unidades. As gratuidades estão previstas no cálculo da tarifa modal.

O aposentado Rui de Lima, de 57 anos, é soropositivo desde 1990. Com o RioCard ilimitado, ele conseguia cumprir a rotina de idas frequentes a médicos de diferentes especialidades, a grupos de apoio, à unidade de saúde para buscar medicamentos e a laboratórios, além de atividades culturais — “parte fundamental do tratamento para amenizar a depressão”, define. No entanto, Rui relata que, há cerca de dois meses, depois do recadastramento, passou a receber apenas uma passagem por semana. A RioCard, no entanto, informou que ele tem direito a duas viagens por semana, conforme necessidade de tratamento apontado pelo laudo médico. “A gente não tem esse benefício só para pegar o medicamento. Temos outros problemas decorrentes do tratamento e precisamos ir a vários médicos. Eu, por exemplo, tenho problemas psiquiátricos, diabetes, hipertensão e câncer, frequento grupo de apoio, mas nada foi levado em consideração”, desabafa. “Se ficar dentro de casa, a pessoa morre. Nossa vida já é meio solitária, desacreditado, nossas amizades diminuem”, acrescenta.

Cazu Barros, de 44 anos, seguia para seu médico na Tijuca quando entrou no ônibus e o cartão não funcionou. O usuário ligou para a RioCard e soube que deveria ir a uma clínica da família, onde é determinado o número de passagens. Ele, no entanto, alega que a clínica não abrange a área de sua residência, em Copacabana. e “Estou há quase dois meses sem passe. Eu vivo com HIV há 26 anos porque durante esse tempo tive acesso ao tratamento”, reclamou. A Secretaria Municipal de Saúde orientou que Cazu Barros procurasse o Centro Municipal de Saúde João Barros Barreto, em Copacabana, para renovação do benefício.

SMTR: Havia ambiguidade na lei
O também aposentado Paulo Silas Rodrigues, 45 anos, teve o benefício reduzido a três passagens de ida e volta mensais. “Cada médico não exige só uma ida. Tem a consulta, ele pede exames, tem que ir fazer o exame e depois voltar ao médico para apresentar o resultado. Com três passagens por mês, como vou fazer isso tudo?”, questiona. A Secretaria Municipal de Transportes (SMTR) informa que, no Decreto nº 32.842, havia um erro que considerava a pessoa com HIV e o renal crônico como pessoas com deficiência, portanto, com direito ilimitado ao benefício. Segundo o órgão, em outro parágrafo do mesmo decreto, pessoas com HIV e renais crônicos eram consideradas doentes crônicas, o que lhes garantia benefício limitado. “O novo decreto corrige a ambiguidade e coloca o HIV unicamente como doença crônica. Esse fator limita a quantidade de passagens, como já era praticado anteriormente”, afirma a SMTR, em nota. A RioCard afirma que Paulo já participou do recadastramento e recebeu um cartão com o mesmo número de viagens dos anteriores.

Passe Livre Universitário
O Passe Livre Universitário (PLU) concede até quatro viagens por dia a estudantes de cursos presenciais beneficiados pelo governo federal pelo sistema de cotas ou pelo ProUni, e para aqueles que possuem renda familiar de até um salário mínimo. São 53 mil cadastrados. Os estudantes dizem que fizeram um recadastramento no último trimestre de 2015, que valeria por 12 meses, mas tiveram que repetir o procedimento a partir de fevereiro. Segundo o Rio Ônibus, a medida foi tomada após ser detectado excesso de uso suspeito do benefício. Alguns estudantes, porém, reclamam que não foram informados do novo cadastro e tiveram os cartões suspensos. É o caso de Magda Pinto Paz, de 40 anos, estudante de Psicologia, que está há mais de um mês sem o passe livre. “O meu cartão deveria ser renovado só em dezembro de 2016. Não fui avisada desse novo recadastramento. Passei no ônibus e deu cancelado”, diz ela, que mora em Parada de Lucas.

O Rio Ônibus ressalta que o recadastramento é fundamental para garantir o benefício social a quem tem direito. Em uma análise mensal, segundo a empresa, os 53 mil cartões do PLU realizaram 3 milhões de viagens, quase o mesmo total de todos os 665 mil cartões ativos dos estudantes das redes municipal, estadual e federal. A entidade afirma que foi enviada comunicação para todos os alunos por e-mail e uma nova rodada para reforçar a data-limite. Mais informações no site http://cartaoriocard.com.br/rcc/gratuidade

http://odia.ig.com.br/

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