segunda-feira, 30 de maio de 2016

Após revelação de conversa em que critica a Lava Jato, ministro da Transparência pede demissão

Fabiano Silveira foi gravado pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado fazendo críticas à operação e orientando 
defesa do presidente do Senado, Renan Calheiros.


Fabiano Silveira, em imagem de 2015, quando 
então integrava o Conselho Nacional de Justiça.
Por: Felipe Frazão, de Brasília.

O ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Fabiano Silveira, pediu demissão na noite desta segunda-feira. Embora tendo sido convidado por Michel Temer (PMDB) a ficar na pasta, Silveira telefonou para o presidente interino e comunicou sua decisão de deixar o cargo. Depois de Romero Jucá (PMDB-RR), ex-Planejamento, ele é o segundo ministro a cair no governo interino do presidente Michel Temer (PMDB) com a revelação de gravações do ex-diretor da Transpetro Sergio Machado, alvo da Operação Lava Jato, que fechou acordo de delação premiada. Temer não vai se pronunciar nesta segunda. Ele ainda não decidiu quem substituirá o ministro demissionário.

Fabiano Silveira havia conversado mais cedo com presidente interino. Temer pediu que ele se decidisse e então fizesse um comunicado à imprensa, a exemplo do que combinou com Jucá. Silveira sofreu forte pressão dos servidores do órgão. Ao longo do dia, os chefes das 26 Controladorias Regionais da União anunciaram que estavam colocando os cargos à disposição, assim como uma série de servidores que ocupavam funções de confiança. A revelação de diálogos entre Silveira, Sergio Machado e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também alvo da Lava Jato e seu padrinho político, acabaram com a credibilidade de Silveira. O sindicato dos servidores da Controladoria-Geral da União (CGU), órgão que deu origem ao ministério, passou a criticar a ingerência política e promoveu protestos na frente do Palácio do Planalto e na sede do ministério em Brasília. "O Sr. Fabiano não preenche os requisitos de conduta para estar à frente de um órgão que zela pela transparência pública e pelo combate à corrupção", disse a Unacon Sindical.

Em nota, a representação da Transparência Internacional no Brasil rompeu relações com o governo brasileiro e cobrou a demissão do ministro e pediu a investigação do governo sobre os indícios de que Silveira aconselhou alvos da Lava Jato sobre como se defender das apurações. "O governo deve garantir que quaisquer membros do ministério envolvidos em corrupção ou trabalhando contra o curso das investigações sejam exonerados", diz a nota. "Não deve haver impunidade para os corruptos e nem acordos a portas fechadas. É decepcionante que o ministro encarregado da transparência esteja agora sob suspeita, como parte de uma operação abafa.", disse, na nota, Alejandro Salas, Diretor para as Américas da Transparência Internacional.

Na sua carta de demissão, o ministro afirmou que aceitou o cargo para assumir a Transparência "imbuído dos melhores propósitos" e que possui "trajetória de integridade no serviço público e não imaginava ser alvo de especulações tão insólitas". "A situação em que me vi involuntariamente envolvido - pois nada sei da vida de Sergio Machado, nem com ele tenho ou tive qualquer relação - podeira trazer reflexos para o cargo que passei a exercer, de perfil notadamente técnico. Não obstante o fato de que nada atinja a minha conduta, avalio que a melhor decisão é deixar o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle", explica o agora ex-ministro. Ele diz que "jamais intercedeu" junto a órgãos públicos em favor de terceiros - como sugere a gravação, ele teria buscado informações sobre a investigação contra Renan Calheiros. "Observo ser um despropósito sugerir que o Ministério Público possa sofrer algum tipo de influência externa", afirma.

Ele negou ter tentado orientar a defesa dos investigados, afirmou que não foi convocado para nenhuma reunião e nem sabia da presença de Sergio Machado na conversa. Segundo ele, o contexto da conversa gravada era de "informalidade" com pessoas que "se diziam a todo instante inocentes""Não há em minhas palavras nenhuma oposição aos trabalhos do Ministério Público ou do Judiciário, instituições pelas quais tenho enorme respeito", alegou. "Foram cometários genéricos e simples opinião, decerto amplificados pelo clima de exasperação política que todos testemunhamos." O senador Renan Calheiros, a quem é atribuído o apadrinhamento político de Silveira, afirmou, por meio de nota, reproduzida abaixo, que não interferiu na montagem do governo Temer. "Em face das especulações, reitero de maneira pública e oficial que não irei indicar, sugerir, endossar, recomendar e nem mesmo opinar sobre a escolha de autoridades no governo do Presidente Michel Temer. Independentemente de sermos do mesmo partido e das convergências em nome do Brasil, tive oportunidade de externar ao Senhor Presidente da República que a indicação de nomes é incompatível com a independência entre os Poderes da República. Nos dois encontros que mantivemos defendi, como já o fiz publicamente, que minha contribuição se dará a partir de agendas e programas. Essa é a melhor maneira de colaborar para superarmos a grave crise atual".

Fabiano Silveira é consultor legislativo do Senado para direito penal, processual penal e penitenciário. Ele havia sido conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público, entre 2011 e 2013, e ouvidor-geral do Conselho Nacional de Justiça, entre 2015 e 2016.

Leia a carta de demissão destinada a Michel Temer por Fabiano Silveira:

Recebi do Presidente Michel Temer o honroso convite para chefiar o Ministério da transparência, Fiscalização e Controle. Nesse período, estive imbuído dos melhores propósitos e motivado a realizar um bom trabalho à frente da pasta. Pela minha trajetória de integridade no serviço público, não imaginava ser alvo de especulações tão insólitas. Não há em minhas palavras nenhuma oposição aos trabalhos do Ministério Público ou do Judiciário, instituições pelas quais tenho grande respeito. Foram comentários genéricos e simples opinião, decerto amplificados pelo clima de exasperação política que todos testemunhamos. Não sabia da presença de Sérgio Machado. Não fui chamado para uma reunião. O contexto era de informalidade baseado nas declarações de quem se dizia a todo instante inocente.

Reitero que jamais intercedi junto a órgãos públicos em favor de terceiros. Observo ser um despropósito sugerir que o Ministério Público possa sofrer algum tipo de influência externa, tantas foram as demonstrações de independência no cumprimento de seus deveres ao longo de todos esses anos. A situação em que me vi involuntariamente envolvido - pois nada sei da vida de Sérgio Machado, nem com ele tenho ou tive qualquer relação - poderia trazer reflexos para o cargo que passei a exercer, de perfil notadamente técnico. Não obstante o fato de que nada atinja a minha conduta, avalio que a melhor decisão é deixar o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.
Externo ao Senhor Presidente da República o meu profundo agradecimento pela confiança reiterada.

Confira abaixo a nota da Transparência Internacional:

Transparência Internacional, a organização global anti-corrupção, exorta o governo do Brasil a investigar exaustivamente as alegações de que o ministro para a Transparência, Fiscalização e Controle (MTFC) aconselhou políticos sobre como driblar investigações no escândalo Petrobras. O governo deve garantir que quaisquer membros do ministério envolvidos em corrupção ou trabalhando contra o curso das investigações sejam exonerados. Este comunicado segue revelações da imprensa, em 29 de maio, de gravações de conversas que mostram o ministro supostamente orientando o presidente do Senado como esquivar-se das investigações na Operação Lava Jato. "Ninguém deve estar acima da lei. Não deve haver impunidade para os corruptos e nem acordos a portas fechadas. É decepcionante que o ministro encarregado da transparência esteja agora sob suspeita, como parte de uma operação abafa.", disse Alejandro Salas, Diretor para as Américas da Transparência Internacional.

A Transparência Internacional irá suspender o diálogo com o MTFC até que uma apuração plena seja realizada e um novo ministro com experiência adequada na luta contra a corrupção seja nomeado. Transparência Internacional tem mantido uma relação construtiva com a CGU, agora o MTFC, há mais de cinco anos sobre a forma de prevenir a corrupção e a importância de se estabelecerem investigações independentes e transparentes, com as quais o público possa ver que não há impunidade para os corruptos. Transparência Internacional tem apoiado a forte posição tomada pelo Poder Judiciário e o Ministério Público Federal em sua condução de investigações de grandes casos de corrupção, que vêm levando à justiça tanto políticos quanto líderes empresariais poderosos.

http://veja.abril.com.br/

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