quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Coronéis são afastados por fraudes em hospitais da PM


As investigações sobre a máfia da saúde na PM provocaram a queda de quatro coronéis da cúpula do setor na corporação. A transferência do grupo para a Diretoria Geral de Pessoal (DGP), a famosa geladeira, foi publicada no boletim interno 199 de ontem, como divulgou com exclusividade o blog ‘Justiça e Cidadania’, de O DIA.

O escândalo de mais de R$ 16 milhões é investigado pelos militares, pela Subsecretaria de Inteligência, da Secretaria de Segurança, e pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público. Para o comandante-geral da PM, coronel José Luís Castro Menezes, o afastamento dos oficiais é para dar transparência as apurações subordinadas à Corregedoria. “Não posso dizer que eles são culpados ou suspeitos. Há investigações em curso. O objetivo é dar transparência e isenção”, afirmou Castro.

No epicentro das fraudes estão os hospitais da corporação no Estácio e em Niterói. Por isso, deixaram os cargos respectivamente os coronéis Armando Porto Carreiro e Sérgio Sardinha. Acima dos dois estava o oficial Alberto Alves Borges, da Diretoria Geral de Saúde (DGS) também transferido para a geladeira. No lugar dele, assume o coronel Alexandre Augusto Brito de Aragão, que era da diretoria da Policlínica de Olaria. Outro afastado é o coronel Kleber dos Santos Martins, da Diretoria Geral de Administração e Finanças (DGAF), que paga e fiscaliza as compras para as unidades.

Nos bastidores, oficiais graduados atestam que a queda dos oficiais era inevitável. Isso porque, a compra de material médico-hospitalar passava pelas Diretorias de Saúde e Geral de Administração e Finanças — e os maiores focos de fraudes estão nos hospitais. Porém, a inspeção que chamou mais a atenção foi a compra para o Hospital Central da Polícia Militar, por R$ 4,4 milhões, de 75 mil litros de ácido peracético — usado para esterilizar material cirúrgico — mas sequer recebeu o produto, como revelou o blog. O então diretor Porto Carreiro em depoimento ao Gaeco disse que a assinatura do pedido não era dele. Ele foi substituído pelo tenente-coronel André Luís Barreira.

O boletim publicado ontem com as exonerações | Foto: Reprodução

Esquema de compra ‘pegava carona’ em outras licitações
Três dos quatro oficiais exonerados colaboravam com as investigações feitas pela Subsecretaria de Inteligência e com promotores do Gaeco. O grupo revelou que uma das técnicas usadas no esquema fraudulento era pegar ‘carona’ em licitações feitas por outros órgãos. Foi assim com a Medical West Comércio de Produtores Médicos Hospitalares Ltda, fornecedora do ácido peracético, que tem contratos com o governo do Estado. É chamada adesão por tomada de preço, sem licitação. Os processos finalizados não eram enviados ao Tribunal de Contas do Estado, órgão fiscalizador, como determina a Resolução 244/2007. Apesar dos valores milionários de material médico-hospitalar negociados com recursos do Fundo de Saúde da Polícia Militar (Fuspom), sob a responsabilidade do coronel Décio Almeida, faltaram medicamentos oncológicos e até de Novalgina no Hospital Central da PM, no Estácio.

Contratos milionários
A atuação da máfia em unidades hospitalares da Polícia Militar tem como mote também o o desvio de próteses e material de rouparia. No Hospital da corporação em Niterói, foram comprados 13.720 lençóis, mas em auditoria foi constatado o desaparecimento de 9.620 deles. A compra lícita, e que teve outros itens, custou um pouco mais de R$ 1 milhão. Outra investigação foi aberta para apurar o desvio de stent — prótese implantada para abrir as artérias — no HCPM. Em uma inspeção, foi constatado que a corporação adquiriu lote de aparelhos por R$ 2,1 milhões. Mas 14 deles, avaliados em mais de R$ 100 mil, não foram localizados. A PM procura ainda 18 mil kits para testes imunológicos, comprados por R$ 1,7 milhão. Os tentáculos das fraudes são tão grandes que foi detectado o sumiço de 8.823 kits de curativos. A compra foi de R$ 1,3 milhão, mas o que está no estoque não passa de R$ 764 mil. Este ano foram adquiridos 4.600 kits cirúrgicos comprados pelo Hospital Central, mas 1.607 estão desaparecidos. O chefe administrativo do Estado-Maior, Ricardo Pacheco, quer que a Procuradoria do Estado ajude a PM a reaver o dinheiro das fraudes. As investigações geraram tanta apreensão entre os oficiais, que um dos Inquéritos Policial Militar sobre a compra de ácido pericético está guardado em cofre do Quartel General da PM.

“O que queremos apenas é que a apuração seja feita de forma clara. Temos que punir os responsáveis”, afirmou o comandante-geral da PM, coronel José Luís Castro Menezes. O material da apuração será encaminhado à promotoria que atua junto à Auditoria de Justiça Militar. Os inquéritos têm prazo de 30 dias e podem ser prorrogados por mais tempo pelo Ministério Público.

Fraudes acontecem em compra, falta e desaparecimento de material hospitalar
Só na PM foram abertos oito inquéritos e até o fim da semana poderá ser instaurado mais um para investigar o desaparecimento de itens que vão de lençóis a aparelhos de ar-condicionados. “Só queremos punir os responsáveis. Portanto, a mudança nos comandos das diretorias e unidades é apenas para garantir o máximo de transparência”, informou o chefe administrativo do Estado-Maior, Ricardo Pacheco, que acompanha as investigações de perto. As inspeções nas unidades são fotografadas e os relatórios encaminhados diretamente a Pacheco. Por enquanto, as auditorias tratam apenas das compras de material médico-hospitalar, além de equipamentos, feitas este ano. O objetivo, no entanto, é investigar todos os contratos desde 2010. Serão ouvidos os donos de quatro empresas fornecedoras dos produtos para a PM.


“Encontramos todos os tipos de fraude. Na compra, no desaparecimento de material, na falta de entrega do produto e até no chamado ‘saldo de utilização para troca’. Ou seja, o que era comprado não era entregue e ficava como uma espécie de crédito”, explicou Pacheco.

O pagamento de todas as compras de material médico-hospitalar é feito pelo Fundo de Saúde da Polícia Militar (Fuspom). O fundo é bancado por militares que têm desconto de 10% do soldo e de mais 1% para cada dependente. A contribuição não é obrigatória. É do fundo também que saem os recursos para toda a rede hospitalar. É no Fuspom que está sendo concentrada outra parte da investigação. No centro da apuração está o coronel Décio Almeida, que só deixou o cargo em setembro, transferido para a Diretoria Geral de Pessoal (DGP). Ele foi substituído pelo coronel Nelson Pitta de Castro Netto. Há depoimentos que dão conta de que na gestão Décio não houve licitações. Segundo os depoentes, o poder dele seria tal que mesmo antes de assumir a função de gestor do Fuspom, ainda como subdiretor administrativo do HCPM, ameaçava quem o desobedecesse ou quisesse a sua substituição do cargo.

Todos os oficiais que trabalhavam diretamente com Décio também são alvos de investigação. O oficial foi promovido a coronel em dezembro e em seguida assumiu o Fuspom, para insatisfação de muitos oficiais. Na PM, na Subsecretaria de Inteligência e no Gaeco pelo menos cinco oficiais já foram ouvidos em procedimentos distintos. Documentos e assinaturas com suspeitas de fraude serão periciadas.

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