sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Quiosques ajudaram caixa 2 de Bethlem

Deputado federal teria recebido contribuições de empresários da Orla Rio, revela revista ‘Época’.


HERCULANO BARRETO FILHO E JULIANA DAL PIVA

Rio - Novas anotações e trocas de e-mails envolvendo o deputado federal Rodrigo Bethlem (PMDB) aumentam o leque de suspeitas de favorecimentos e verbas recebidas pelo caixa 2 da campanha para a eleição de 2010. Em dezembro de 2009, enquanto as fiscalizações a camelôs eram intensificadas nas praias cariocas, o então secretário municipal de Ordem Pública teria beneficiado a Orla Rio Associados, empresa privada que ampliava a sua ação nos quiosques com a instalação de barracas nas areias do Leme ao Recreio dos Bandeirantes. A denúncia foi feita à Revista ‘Época’ pela empresária Vanessa Felippe, ex-mulher do político. A empresa negou as acusações. Os documentos obtidos pela revista mostram anotações que seriam da contabilidade da campanha de Bethlem, segundo Vanessa. Em meio às contribuições, há pelo menos quatro anotações citando ‘Orla’ ao lado de números, que indicariam as contribuições à campanha, de acordo com a empresária. Ainda segundo a revista, o material revela acordo entre Bethlem e João Marcello Barreto, vice-presidente da Orla Rio Associados, que estava à frente da Associação de Barraqueiros da Cidade do Rio (PróRio), ligada à concessionária. No dia 10 de setembro de 2009, João Marcello enviou e-mail com o esboço de uma carta que Bethlem deveria enviar à Secretaria de Patrimônio da União (SPU), que possui a propriedade da areia das praias, pedindo a autorização para instalar barracas, cadeiras de praia e guarda-sol.

O documento estava pronto, faltando apenas a assinatura do secretário. “É muito importante nós termos isso assinado até segunda se possível (...). Com isso será menos um problema para nós”, escreveu João Marcello, no e-mail enviado a Bethlem. Para sensibilizar a União, Bethlem argumenta que a autorização iria contribuir com o recolhimento de lixo, preparando a área para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 no Rio. A Orla Rio Associados afirmou que a solicitação de pontos de apoio nas areias foi feita em agosto de 2009 e negada em maio do ano seguinte. Disse ter sido convocada por outras associações a fazer parte da Pró-Rio. Segundo a empresa, em janeiro, o Ministério Público arquivou inquérito aberto na época da criação da PróRio. Isso demonstra, segundo a empresa, que não houve favorecimento.

Bethlem já foi condenado por propaganda eleitoral irregular 
Em agosto de 2012, Rodrigo Bethlem foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) a pagamento de multa pela veiculação de propaganda eleitoral irregular em bem particular. A denúncia foi feita durante a eleição de 2010, quando ele foi eleito deputado federal. O político foi acusado de utilização de 25 placas próximas, ultrapassando o limite de quatro metros quadrados, área máxima permitida para veiculação de propaganda eleitoral, de acordo com o parágrafo 2º do Artigo 37 da Lei 9.504/97. Em setembro de 2011, Bethlem e um deputado estadual foram acusados, em outra investigação judicial eleitoral, por abuso de poder econômico, conduta vedada e captação ilícita de sufrágio, com penas previstas de multa, cassação do registro ou diploma e inelegibilidade num período de até oito anos.


Na época, uma equipe de fiscalização do TRE-RJ suspendeu as atividades de um centro de atendimento às comunidades, em Bangu, que tinha sido inaugurado em junho daquele ano e atendia à população gratuitamente, oferecendo auxílio médico. Bethlem se associou ao local e fez doações de equipamentos para implantar um projeto de assistência odontológica para a terceira idade. Fotos feitas pela equipe do TRE-RJ flagraram propaganda eleitoral na fachada do estabelecimento. No fim do processo, Bethlem e o outro deputado foram absolvidos. Procurada, a assessoria de imprensa de Bethlem disse que ele não irá se pronunciar sobre os casos.

O 'martírio' antes de jogar a toalha
Quando as denúncias vieram à tona, na sexta-feira, Rodrigo Bethlem se preparava para cumprir uma agenda na Zona Oeste. Abandonou-a ainda no caminho, assim que soube da existência dos vídeos e gravações. Ele ficara sabendo das acusações da ex-mulher quatro dias antes. Fontes contam que a argumentação de defesa usando a doença de Vanessa já estava pronta e documentada quando o escândalo se tornou público. Bethlem só não imaginava o potencial do estrago. Em pouco tempo, ele reuniu seu círculo mais próximo e a cúpula da campanha na casa do advogado Michel Assef. A tentativa de controlar a situação entrou pela madrugada com a distribuição de notas à imprensa. 


No sábado, Bethlem sentiu o tamanho da gravidade da situação. Na prefeitura ninguém atendia suas ligações. Mais tarde, o tom da coletiva reforçou o isolamento político. A providência seguinte foi suspender as atividades de campanha por tempo indeterminado. Ainda no domingo, o ‘QG’ da campanha na Gamboa foi inteiramente desmontado, e o material produzido, descartado. Cerca de 80 funcionários foram informados de que as atividades estavam suspensas até segunda ordem. Na última segunda-feira, os mais próximos ainda acreditavam que a situação podia ser contornada. Mas a publicação de novas denúncias no fim do dia enterrou as poucas esperanças que restavam. A renúncia à candidatura foi um martírio que começou na quarta-feira, mas só se encerrou ontem. Na quinta, o governador Pezão já anunciava a saída, mas Bethlem não confirmava. Resistia à espera de um apoio que não veio. Entregou os pontos poucas horas antes de novas denúncias de corrupção.

Convênios que vão até 2016 
O Centro Comunitário Lídia dos Santos (Ceaca Vila), cujo contrato foi renovado em 2012, na gestão do então secretário de Assistência Social Rodrigo Bethlem, possui convênios com a Prefeitura do Rio no valor total de R$ 214,8 milhões. Segundo dados do portal Rio Transparente, sete dos 11 convênios estão ativos, sendo que dois vão até 2016. Os convênios da Ceaca Vila são para a cogestão de Centros de Acolhimentos de Crianças e Adolescentes. Na porta de um deles, em Laranjeiras, o ‘RJ TV’, da Rede Globo, flagrou, ontem, jovens cheirando solvente. A Ceaca é uma das cinco ONGs investigadas pelo TCM. Levantamento da vereadora Teresa Bergher (PSDB) mostra que essas entidades ficaram com 79% dos R$ 322 milhões da verba da secretaria para assistência social. Ontem, vereadores pediram explicações à prefeitura e ao TCM sobre denúncias envolvendo Bethlem.

Irregularidades identificadas 
A prefeitura informou que, nos sete contratos ainda ativos com a ONG Tesloo (Obra Social João Batista) no sistema Rio Transparente, foram verificadas irregularidades nas prestações de contas — entre elas, o não cumprimento de obrigações trabalhistas, falta de notas fiscais e serviços que foram entregues parcialmente. Em virtude dos erros, os saldos existentes nos contratos — no valor de R$ 2,5 milhões e que ainda aparecem empenhados — não serão pagos. Qualquer contestação por parte da ONG sobre o direito às verbas somente será analisada pela prefeitura após a conclusão das apurações de todos os contratos firmados pela Secretaria de Desenvolvimento Social na gestão de Rodrigo Bethlem. 

O escândalo da Tesloo foi revelado em 2012, quando O DIA noticiou que o major reformado da PM Sérgio Pereira de Magalhães Júnior geria contratos com a prefeitura para tratar de dependentes de crack. O PM tinha no currículo 42 mortes em confronto, e a ONG, lista de maus-tratos aos internos e superfaturamento nos preços.

http://odia.ig.com.br/

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